quarta-feira, 6 de julho de 2011

Hippie Chique

Se uma calça rasgada carrega em uma estampa sua cara de jeans.
Eu viro a casaca,
me viro de cara,
me esqueço da raiva,
e desejo esquecer.
Se as blusas listradas
confundirem os filmes,
Troque-as por saias,
Também vire a cara
e me faça valer.
Cada centavo é um astro,
Compilador e polidor de estigmas.
Mais que direito, eu tenho o dever.
Requinte é requinte,
e você é você.

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Banana pra dar e vender


Não estou aqui fingindo desconhecer o evidente apelo da maior cerimonia de premiação cinematográfica do mundo, afinal de contas este evento sustenta há algum tempo a estética do entretenimento e consumo hollywoodiano.

Enquanto a ideologia das celebridades e dos blockbusters é premiada em Los Angeles, milhares de brasileiros, cinéfilos baseados em "temperatura máxima", torcem fanaticamente pelas raras indicações do terceiro mundo ao prêmio mais desejado do cinema mundial.

Entretanto isso tudo não me diz respeito. Os vestidos, os paparazzis , o tapete vermelho.Toda esta contravenção parece intimidar o cinema político e poético esquecido pelos prêmios e orçamentos grandiosos dos monopólios de distribuição.

A verdade é que o cinema de qualificação artística do mundo inteiro segue subjugado por uma estética imperialista que nunca reconheceu maneiras diferentes de se fazer um filme. Não adianta relativizar e suavizar a crítica a este modelo. Chega de banana aos macacos. Aliás banana para Globo Filmes, banana para o moralista e cafona Cisne Negro e banana para o oportunista Vik Muniz e sua evidente exploração à "cosmética da fome", que distorce e ridiculariza os objetivos expostos pelo Cinema Novo no Brasil.

O legal de tudo isso é que tem gente a beça que não se importa com o Oscar, e a mesma Sony que desgraça a distribuição de filmes no mundo, viabiliza através de suas contradições tecnológicas o material para o desenvolvimento do cinema independente no mundo.

SARAVÁ

Pedro Vasconcelos.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Rei em Buenos Aires



Parece pouco, mas para mim foi muito.

"Eu também gosto de Roberto. No Brasil nós o chamamos de Rei". Aos poucos minhas respostas enchiam os olhos do taxista Argentino. Juan Manoel, jovem e bem humorado que não escondia sua curiosidade e admiração pelo Brasil.

Em Buenos Aires conheci pessoas, monumentos históricos e me deliciei com os chouriços mal passados acompanhados de inigualáveis vinhos. Mas foram os poucos minutos dentro daquele táxi que de fato justificaram este ato de viajar, de ir ao encontro de algo desconhecido.

Depois de um dia de passeios turísticos no bairro La Boca, um dos mais pobres da capital Argentina eu e minha namorada Flora decidimos ir até Avenida Santa Fé, atraídos pelo apelo comercial da região.

Entramos dentro de um táxi um pouco acabado.O carro antigo, com o para choque quebrado era um indício de que talvez o homem que o conduzia fosse morador do bairro.O taxista abaixou o volume do som, que tocava um merengue bem animado e com muita simpatia nos perguntou o nosso destino. Conduzido pelo sotaque de minha resposta ele percebeu que eu era Brasileiro. A partir deste ponto o motorista que agia com cordialidade, passou a agir como um velho amigo, companheiro de América do Sul.

Pode parecer clichê de tele novela, mas o fato é que as pessoas mais pobres sempre se apresentam a mim de uma maneira muito mais acessível, e isto acontece no mundo inteiro.Naquele momento, quase no último dia de viajem tive a sensação real de ter conhecido enfim um verdadeiro representante da população Argentina.

Através do seu crachá de identificação fiquei sabendo o seu nome. Juan Manoel me chamava de Pedro com enorme intimidade, e ria todas às vezes que eu pronunciava o palavras com "d" e "r" juntos. Nosso primeiro assunto foi música.O jovem não escondeu sua enorme admiração pela música brasileira, sobretudo sua idolatria ao cantor Roberto Carlos. Quando soube que no Brasil o apelidamos carinhosamente de Rei, ele se mostrou surpreso e contente ao saber do enorme reconhecimento de seu ídolo.

Adiante, mais sereno ele afirmou que o rei do Brasil era o Lula. Sim, é de arrepiar a maneira com que nós brasileiros somos agora respeitados nos outros países. E da para se orgulhar da política social do Brasil que agora serve de exemplo para outras nações do mundo.

Compartilhamos diversas informações sobre projetos sociais dos dois países que estão modificando o cenário de desigualdade, exploração e pobreza da América Latina. Esta conversa expôs outra característica do argentino. Além de loucos por futebol, são muito politizados. Isso talvez explique a idolatria do povo à Ernesto Guevara, estampado no braço de Maradona e em toda Buenos Aires. Idolatria que a revista Veja com o ar arrogante de seus colunistas faz questão de ridicularizar e fingir que não entende o seu "porquê".

A circulação do Real em bairros burgueses de Buenos Aires é muito comum. mas aquele argentino, morador do Boca nunca havia visto a nossa moeda. Achou bonita e sugeriu que as notas maiores trouxessem em seu verso a imagem do nosso ex presidente. Com cortesia e orgulho, elogiei Carlos Gardel e as políticas inclusivas da presidente Christina.

Após o nosso longo papo sobre política , a nossa recíproca admiração idearia ficou evidente. Ele nos apresentou um lugar mais modesto e mais barato para compras. Olhou em meus olhos que estavam vermelhos devido a alta dose de medicação que tomo na luta contra uma rejeição de transplante de córnea, e me desejou melhoras.Um dos mais sinceros desejos dos muitos que venho recebendo, apertamos firmemente nossas mãos e nos despedimos, conscientes de que não estávamos sozinhos em nossa eterna luta na terra.

Viajar não é a procura do diferente, como disse anteriormente e sim o encontro daquilo que nos torna iguais, uma maneira saudável, às vezes simples, às vezes penosa de se reconhecer em espelhos de humanidade espalhados pelo mundo.

pedro vasconcelos. 21/01/11